segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Você aqui

Ainda não sei ao certo quem de nós começou com essa coisa toda. E aí te vi aqui dentro, mas não sei se está dentro ou se está só na minha ilusão do que é estar aqui dentro. E me peguei gostando disso tudo, desse seu dia que não vi, desse seu cansaço, da sua rotina, desse seu sono, do seu silencio, dessa sua paciência, da sua tristeza, das suas histórias, do seu aí, tão longe e aqui, aqui dentro...
Ainda não sei ao certo o que é sentir a sua falta, já que a presença nunca esteve, mas te  sinto tão perto que os dias que você não vem - desse jeito sem vir - ficam vazios e solitários. E ainda não sei ao certo o quanto isso tudo significa. Talvez você seja a minha necessidade de pensar em mim mesma. Talvez você seja eu mesma do lado avesso. E às vezes eu acho melhor não entender e só ter você - desse jeito sem ter. E me peguei gostando daquilo que não entendo, por não estar aí...eu, aí dentro.


Texto: Duane Valentim
Imagem: Romero Britto

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Acordou

Ela acorda pronta.
Fica pronta o dia todo.
Foi educada para estar pronta.
Ela escuta e vê e olha...tudo com a lenta paciência.

Não diz nada, mas sorri. Máscara perfeita que esconde o descaso com o mundo todo, o descaso com seu todo - mundo. 
E segura o riso dentro de si para esconder sua intolerância, sua ânsia dos pensamentos dos outros.

Mas por fora ela está pronta. Por dentro, também.
Guarda para si seu mundo mesquinho e coloca do lado de fora só o que é bem recebido.
E ri por dentro da maldade toda que esconde: Que coisa maravilhosa essa de poder saber o que se pensa, e falar aquilo que não pensa. Agradar!

Por dentro, todo o vento.
Calada, está pronta.



Texto: Duane Valentim

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Alguém

Eu, que como remédio das minhas dores submersas, inventei o dia lotado, os deveres e os prazos. Menti para os meus sonhos adiados, ignorei os alcançados, ri do meu choro e chorei por me ver sentada buscando uma dor para ser chorada.

Eu, que fiz de mim o barulho silenciado, que esqueci os poemas decorados e deixei morrer as cores da casa, me vejo, agora, sem nada para culpar. Nada. Ninguém.

Não há nada que me faça levantar dessa cama e me libertar desses pensamentos tão vazios, tão sem importância, tão sem esperança. Não há nada nem ninguém que me faça sair pelas ruas, sair pela noite, sair de dentro dessa casca mentirosa. Não há nada nem ninguém que me prenda no vazio escuro que escolhi ficar, que me prenda nesses sapatos imóveis, que me prenda nessa dor que não há.

Não há ninguém para segurar a mão livre e jogada num canto do corpo melancólico. Não há ninguém por quem o sorriso escape no rosto, por quem os olhos respirem a paz calma e doentia de quem ama.

Não há ninguém. Não há.


Texto: Duane Valentim
Tela: Tristeza